sábado, 20 de julho de 2019

SEIS DIVAGAÇÕES SOBRE HISTÓRIA COMPARADA


SEIS DIVAGAÇÕES SOBRE HISTÓRIA COMPARADA

  1. De proêmio, tanto na Antiguidade como no Medievo, temos uma classe aristocrático-militar que não trabalha e que nutre sua existência material mediante extorsão de uma parcela da produção social realizada pelos trabalhadores rurais (um “excedente econômico”, por assim dizer) mediante a violência.
  2. No entanto, os escravos antigos são mais espoliados que os servos medievais, o que se observa na maior opulência material da classe aristocrático-militar da Antiguidade ocidental, máxime do Império Romano, indício de que o consumo improdutivo de tal classe improdutiva antiga era comparativamente maior do que o consumo improdutivo da classe nobre medieval.
  3. Nesse diapasão, à classe servil medieval era factível investir produtivamente certo excedente econômico que lhe restava após o desconto da corveia, de que resultou o advento de um comércio e uma produção artesanal que puderam prosperar comparativamente mais do que o comércio e o artesanato antigos, fomentando as bases materiais do ulterior modo de produção capitalista.
  4. Cabe aduzir que a região onde os servos da gleba exibiam maior liberdade econômica em relação à nobreza medieval, no atual Reino Unido, tais bases materiais cresceram mais rapidamente do que no restante da Europa, favorecendo portanto a eclosão da Revolução Industrial do século XVIII naquelas plagas.
  5. Com o advento do modo de produção capitalista, exsurge uma classe burguesa industrial que, sem produzir diretamente, administra, porém, por meio de sua propriedade privada e posse direta dos meios de produção, o trabalho da classe produtora operária, dela extorquindo um excedente econômico, a mais-valia, que é em parte consumido produtivamente, enquanto outra parte é incorporada ao consumo improdutivo tanto dessa burguesia industrial quanto da classe integrante de um novo estamento improdutivo que constitui o Estado burocrático-militar capitalista, sendo certo que esta parte do consumo improdutivo estatal identifica-se com o novo arcabouço tributário mantenedor de tal classe burocrático-militar.
  6. Um exemplo histórico peculiar de como o excedente econômico produtivamente reinvestido proporciona uma desinibição mais célere das forças produtivas seria o caso observado na Guerra Civil do século XIX, nos atuais Estados Unidos da América: o sul escravista, em que praticamente todo o excedente econômico era improdutivamente consumido pela aristocracia rural, não foi capaz de derrotar militarmente o norte da pequena propriedade privada dos meios de produção, onde o excedente econômico era reinvestido produtivamente por tais pequenos proprietários livres de obrigações servis ou escravistas, de que resultou uma atividade industrial pujante que mais tarde se firmaria como a maior potência econômica no mundo. (por LUIS FERNANDO FRANCO MARTINS FERREIRA, historiador)

terça-feira, 16 de julho de 2019

O SUJEITO COGNOSCENTE COMO SER SOCIAL, OU BREVÍSSIMAS CONSIDERAÇÕES SOBRE EPISTEMOLOGIA MATERIALISTA.

O proletariado exsurge na história como a classe social por excelência, porquanto completamente despojada da propriedade dos meios de produção, o que lhe confere um caráter internacional e universal. 

Seus membros, bem assim seus intelectuais orgânicos (na acepção de Gramsci), são potencialmente capazes de alcançar uma consciência de classe que ultrapassa a consciência individual dos detentores de propriedade privada de meios de produção, como a burguesia e quejandos. 

Tal consciência de classe interfere no campo do conhecimento, eis que, superando a perspectiva individual, o proletariado e seus intelectuais orgânicos podem apreender uma duração que também suplanta a duração de uma vida individual, atingindo assim a história não apenas dos indivíduos, mas das classes sociais. 

Dessa forma, Marx e Engels, intelectuais orgânicos do proletariado, foram os pioneiros a descortinar a história das classes sociais e suas lutas respectivas, bem assim a história dos diversos modos de produção ao longo do tempo, cuja dinâmica revelaram na contradição entre as forças produtivas e as relações de produção. 

Nesse mesmo passo, restaram superadas, no âmbito da epistemologia, as perspectivas empirista e racionalista, vinculadas ao indivíduo como sujeito cognoscente, na medida em que o materialismo erigiu o ser social (ou a classe social) como ponto de partida para aquisição de conhecimento. 

(por Luis Fernando Franco Martins Ferreira, historiador).