quarta-feira, 27 de setembro de 2023

Entrevista: Walcir Previtale Bruno, dirigente sindical.

 O Núcleo de Estudos do Capital do Partido dos Trabalhadores tem a grande honra e a grata satisfação de apresentar sua entrevista com o companheiro Walcir Previtale Bruno, dirigente sindical da CONTRAF da CUT e um de seus mais destacados militantes.

Sem mais delongas, vamos à entrevista:

NEC: Companheiro Walcir, discorra por gentileza sobre o início de sua militância no sindicato e no partido.

Walcir:

Início da militância: Partido 

Tudo começou em 1982, quando meus pais mudam de casa, deixando o antigo bairro da Penha (zona leste da capital paulista) e se fixando em um outro bairro, também na zona leste, chamado Engenheiro Goulart. Naquela época eu tinha 14 anos e foi nesse novo bairro que passei a conhecer os meus novos vizinhos e novas perspectivas. Alguns meses depois conheci um menino, um ano mais novo que eu, chamado Lincoln Secco que morava bem perto de casa. Lincoln era o nosso amigo dos livros, sempre com um livro em mãos e uma boa conversa. Também conheci outro camarada, o Carlos Santiago, que fez parte dessa trajetória militante, que morava na mesma rua que eu. Carlos era o amigo da tecnologia. Já naquela época ele queria estudar química. 

E foi por um convite do camarada Secco que participei, pela primeira vez, no bairro do Cangaíba, de uma reunião do PCB. Se eu não estiver enganado o ano era 1984. Lembro até hoje da sala onde, pela primeira vez, ouvi a palavra comunismo saída da boca do camarada Heitor Sândalo, um dirigente do PCB e morador do bairro. Heitor, uma figura histórica das lutas da classe trabalhadora, foi um dos precursores da minha militância partidária. Mas, a influência do camarada Secco foi decisiva para trilhar os caminhos da esquerda. Também em 1984, Secco aparece no bairro com um livrinho que acabou fazendo uma grande diferença a partir daquele momento. O livro nada mais era que o Manifesto Comunista, de Marx e Engels. 

Bom, depois do PCB e de inúmeras leituras e debates apaixonados, acabamos migrando para o PT. Iniciamos a militância participando das reuniões que aconteciam no diretório zonal (DZ) de Ermelino Matarazzo, um bairro operário da zona leste. Todos os domingos lá estavam os três jovens do Engenheiro Goulart para discutir política dentro de um também jovem partido, o PT, que tinha 6 anos de idade. Depois, veio a envolvente e apaixonante campanha Lula Presidente 89. Quase lá! Depois veio a filiação. Em 1992, veio o NEC, um núcleo de jovens do PT, com o objetivo central de ler e entender a brilhante obra de Karl Marx, O Capital. Do NEC veio a aproximação com o professor Florestan Fernandes, com Paul Singer. A história é longa. 

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Início da militância: Sindicato

A militância partidária se deu antes do engajamento sindical. 

Em abril de 1987, eu entrei para trabalhar no Banco Bradesco. Estava, então, com 19 anos. O Bradesco foi o primeiro emprego com carteira de trabalho assinada. A informalidade do mercado de trabalho já existia naquela época. Em julho de 1987 eu passo a ser um trabalhador sindicalizado. A partir dai começa também a militância sindical. Em 1991, participo da greve dos bancários e acabo sendo acusado pelo banco como líder de greve. Em 1994, passo a integrar a diretoria do Sindicato dos Bancários de São Paulo, numa eleição muito disputada entre o bancário do Banco do Brasil, Ricardo Berzoini(chapa 1) e Mané Gabeira, do Unibanco, (chapa 2). A Chapa 1 foi vencedora e eu assumi o mandato sindical como diretor da regional Penha do sindicato. Foram 20 anos na direção do Sindicato dos Bancários. Em 2012, assumi um cargo sindical na Confederação dos Bancários da CUT (CONTRAF) onde permaneço até hoje. 

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N: Walcir, qual a relação entre a atual precarização da relação de emprego e a crise do sindicalismo?


W:

A precarização da relação de emprego é o principal problema que enfrentamos hoje, sobretudo a precariedade inicial, que é a forma de contratação da mão de obra do trabalhador. Temos um grande exército de trabalhadores chamados informais, sem registro em carteira, sem garantias mínimas previstos na CLT. Logo, tal precarização – que é projeto político – afeta em cheio o movimento sindical. A baixa taxa de sindicalização que temos hoje no Brasil é um dos termômetros que mede as dificuldades enfrentadas pelo movimento sindical. A precarização também afeta a organização sindical dos trabalhadores. O sindicato não sabe quem são esses trabalhadores/as. Como organizá-los? Qual estratégia?

Logo, as pautas do Partido dos Trabalhadores também são afetadas por essa dita precarização. Um projeto de lei, por exemplo que pretenda mudar algo na CLT – para melhor, é claro  não terá nenhuma repercussão para um trabalhador informal. E os trabalhadores/as de aplicativos? Uma legião de trabalhadores sem quaisquer direitos. E a seguridade social? Como fica? Como esses trabalhadores um dia poderão pensar em aposentadoria? 

Sem dúvidas, enormes desafios para o movimento sindical e para o Partido dos Trabalhadores. 

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N: Walcir, discorra por gentileza sobre a questão atual do imposto sindical.


W: Imposto Sindical: 

Sobre o imposto sindical é preciso destacar que a reforma trabalhista de Temer (2017) foi pensada quase que exclusivamente para acabar com o financiamento sindical. E teve sucesso!

Enquanto muitos sindicatos de trabalhadores fecharam as portas com o fim do imposto, as entidades patronais seguiram com muito dinheiro em caixa. A própria CUT, que, historicamente, nasceu questionando o sindicalismo oficial, passou a ainda passa por dificuldades para financiar as suas atividades sindicais. Acabou o imposto sindical e o que foi colocado no lugar? Nada! 

Restou foi muita polêmica em torno do assunto, porém, nenhuma forma de financiamento sindical foi colocada no lugar até então. Até o STF entrou na questão, reforçando a decisão do Congresso Nacional e tornando inconstitucional a cobrança de qualquer taxa sindical de trabalhador não sindicalizado. Recentemente, o STF mudou a sua posição permitindo o desconto da taxa negocial (que é diferente do imposto sindical) para trabalhadores não sindicalizados. 

Restou para parte do movimento sindical – como os bancários – a negociação coletiva direta com o setor patronal para estabelecer alguma contribuição do trabalhador quando da celebração de um acordo coletivo de trabalho, a chamada taxa negocial. Essa taxa negocial só teria efeito se aprovada em assembleia convocada pelo sindicato. Foi uma estratégia política acertada até o momento e que tem garantido a sobrevivência dos sindicatos, das federações e da confederação.

Entretanto, esse debate ainda vai se alongar no tempo, uma vez que o Senado Federal pretende recolocar o debate do imposto sindical, questionando a recente decisão do STF, favorável ao movimento sindical. 

Não temos dúvidas. Há um esforço imenso do Governo Lula 3 para garantir o papel político e constitucional do movimento sindical. Mas, também, reconhecemos que do outro lado, há um forte movimento para impedir esse avanço. Temer deu um passo importante na tentativa de destruir o movimento sindical. Nos últimos quatro anos o movimento sindical ficou na defensiva. O caminho foiresistir. Agora, o momento é de renascer e reconstruir o Brasil! 

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N: Como tem sido a evolução das medidas patronais e governamentais para evitar acidentes e doenças ocupacionais? 


W: 

4.1) Medidas patronais: 

O campo político da saúde do trabalhador – é assim que os militantes da área compreendem – é um importante espaço da luta que acontece na relação capital e trabalho. A saúde é do trabalhador e não do patrão. O trabalhador é o protagonista central para defender a sua saúde no ambiente de trabalho e não somente o empregador. Hoje, o que acontece é que a saúde do trabalhador foi delegada para as mãos das empresas. Quantas vezes já ouvimos os termos “médico do trabalho”, “enfermeiro do trabalho”. Temos também até “dentista do trabalho”. Quantas empresas possuem departamento de “saúde e segurança do trabalho”? Muitas. E todos esses departamentos são coordenados por um médico especializado em medicina do trabalho. O problema maior não está na denominação desses profissionais e sim no papel político que desempenham a mando das empresas. O setor patronal está muito mais preocupado em reduzir custos, em alçar a saúde do trabalhador ao mundo dos negócios (hoje o mundo corporativo fala em “gestão em saúde e segurança no trabalho) do que, de fato, em implementar, com a participação ativa dos trabalhadores e de seus representantes, uma política de prevenção e redução de acidentes e doenças relacionadas ao trabalho. 

Ou seja, podemos afirmar, sem medo de errar, que no campo da saúde dos trabalhadores, as medidas patronais não visam a melhoria das condições de trabalho e nem a redução de acidentes e doenças. preocupados maior é com a redução de custos. Se o trabalhador adoece? Na maioria das vezes são demitidos. Um trabalhador acidentado? É comum, depois de retornar da licença médica, ser mandado embora.

4.2) Medidas governamentais: 

O Brasil é um dos países que mais tem regramentos legais na área da saúde do trabalhador. São mais de 30 normas regulamentadoras – NR’s -, debatidas, elaboradas e publicadas pelo Ministério do Trabalho, o Brasil é signatário de várias convenções da Organização Internacional do Trabalho - OIT, que versam sobre saúde do trabalhador, a saúde do trabalhador está contida na lei orgânica da saúde, a lei 8080 de 1990, a lei que estabelece o SUS. A saúde do trabalhador é interministerial, ou seja, o assunto é pauta dos ministérios da saúde, do trabalho e da previdência social. No Conselho Nacional de Saúde - CNS existe a Comissão Intersetorial de Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora – CISTT, uma das mais importantes e disputadas comissões orgânica do CNS. 

É preciso registrar que foram nos governos Lula e Dilma que tivemos alguns avanços no campo da saúde do trabalhador. Em 2011, a Presidente Dilma assinou o decreto 7.602, dispondo sobre a “Política Nacional de Segurança e Saúde no Trabalho” - PNSST. Fruto de negociação tripartite (Bancadas de governo, patronal e dos trabalhadores) a política tinha como escopo a “promoção da saúde e a melhoria da qualidade de vida do trabalhador e a prevenção de acidentes”. Um dos objetivos era que a PNSST saísse dos gabinetes em Brasília e chegasse aos estados e municípios, ou seja, chegar até o chão da fábrica, chegar no comércio, nos bancos, no campo, envolvendo trabalhadores públicos e empregados das empresas privadas. 

Participei de vários debates e reuniões tripartites em Brasília sobre a PNSST. Representava a CUT na bancada dos trabalhadores que era formada por sindicalistas de outras centrais. Foram nesses espaços de “dialogo social” que percebi a enorme força da bancada patronal, representada, sobretudo pela Confederação Nacional da Indústria – CNI e pela Confederação Nacional das Instituições Financeiras – CNF. A todo momento a bancada patronal freava qualquer possibilidade de avanços na implementação da PNSST. 

Em outubro de 2015 participei da última reunião, em Brasília, da comissão que discutia a política nacional de saúde do trabalhador. Estávamos na véspera do golpe que derrubou a Presidente Dilma Rousseff. 

Com o golpe de 2016 e a posterior eleição de Bolsonaro, a PNSST foi totalmente esvaziada, inclusive com decreto publicado pelo governo de Bolsonaro extinguindo as comissões que tinham o objetivo de implementar a política de saúde do trabalhador em nosso país. 

Como estamos hoje: como dissemos, temos muitas leis, muitas regras que tratam da saúde dos trabalhadores. Porém, os trabalhadores seguem excluídos de qualquer espaço democrático para debater a sua própria saúde. E para debater a questão da saúde no local de trabalho o empregado, necessariamente, tem que debater o trabalho, debater a organização e o processo de trabalho, ter acesso às informações. O conhecimento do trabalhador tem que ser lavado em consideração. O trabalhador tem que ter em mãos o poder de decidir. Do outro lado, o setor patronal nega todas essas possibilidades e assim seguimos defendendo a democracia que nunca chegou aos locais de trabalho. 

Do ponto de vista de políticas governamentais o momento é de retomada. Porém, é verdade que há uma timidez sobre os assuntos que dizem respeito ao “mundo do trabalho”. O tão esperado “revogaço” não veio da forma como achávamos que viesse. Ainda convivemos com o entulho bolsonarista na área da saúde do trabalhador. Muitas normas foram mudadas – para pior – e agora, o espaço para, pelo menos voltar ao que era, está muito estreito. Via congresso nacional as chances são remotas. Pelo tripartismo – que já está bastante desgastado – a bancada patronal ainda possui forte hegemonia para frear avanços. Podemos concluir que boa parte da classe trabalhadora está adoecida ou em processo de adoecimento por conta do trabalho extenuante, do trabalho super controlado, de cobranças cotidianas, assédio moral, sexual e por aí vai. 

Nesse momento, sem deixar de lado o espaço institucional, um caminho possível e já conhecido pelo movimento sindical é a organização dos trabalhadores para travar a devida luta em defesa da sua saúde. É perseguir o lema do Modelo Operário Italiano – MOI que dizia: “A saúde não se vende, nem se delega, se defende”!

 

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N: A CUT surgiu criticando a CLT e o imposto sindical. Mas depois de várias reformas neoliberais que afetaram o sindicalismo, como você encara a necessidade de defesa da CLT hoje?  


W: 

Bom, depois de tanto retrocesso social patrocinado por reformas neoliberais, que prometiam o paraíso para a classe trabalhadora, defender a CLT hoje é algo necessário e um caminho a ser seguido. É claro que a CLT não consegue dar todas as respostas para o que acontece no mundo do trabalho. Entretanto, sem ela as coisas seriam piores. Acho que além de defendermos a CLT, temos também que criar movimentos para fortalecer e pavimentar caminhos para que a CLT se ramifique no nosso imenso Brasil, que chegue aos locais mais distantes do nosso país. Em um país que convive com trabalho análogo a escravidão a CLT se faz necessária. Em um país, cujo parlamento nacional, aprovou lei liberando a total terceirização da mão de obra, a CLT se torna um instrumento fundamental. No setor financeiro a categoria dos bancários por exemplo, possui muitos direitos sociais amparados na CLT. É na CLT que encontramos a proibição da abertura das agências bancárias aos sábados. Um direito regulado pelo Estado e que muito tem incomodado os banqueiros, apesar do avanço do banco pelo celular.

Logo, defender a CLT nesse momento é uma estratégia para se garantir um mínimo de direitos para a classe trabalhadora. Agora, somente defender não é suficiente. É preciso mais ousadia e organização do movimento sindical. Precisamos de um sindicalismo forte, representativo, combativo, com sustentação financeira e que, ao mesmo tempo, tenha capacidade de negociação.Resgatar experiências passadas, como a organização por local de trabalho, a OLT, o sistema de democratização das relações de trabalho defendido pela CUT, a CIPA – Comissão Interna de Prevenção de Acidentes e pensarmos, coletivamente, em novos mecanismos de organização e participação de uma classe trabalhadora fragmentada, informalizada, terceirizada e “uberizada”. E também desempregada. 

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N: Os bancários, os metalúrgicos e os professores foram grandes categorias da CUT. A automação bancária, o home office e a terceirização abalaram o sindicalismo bancário. No entanto, há milhares de trabalhadores em casas lotéricas e em outros ambientes cumprindo funções de bancário. Como o sindicato pode representá-los?


W:

Essa é uma pergunta que nos remete aos enormes desafios colocados para o movimento sindical bancário. Como representar milhares de trabalhadores que cumprem função de bancário, que fornecem crédito, que lidam com valores, que recebem contas de consumo, que recebem impostos, que operam no mercado financeiro e não são bancários? E a resposta? Infelizmente, não temos uma resposta pronta e acabada. 

Hoje, somos aproximadamente, 450 mil bancários e bancárias, empregados diretamente pelos bancos. Nesse contingente está incluído os trabalhadores dos bancos públicos e dos bancos privados. Já o ramo financeiro, que congrega todas as empresas que prestam serviços bancários, como as casas lotéricas, os correspondentes bancários, lojas, as cooperativas de crédito e muitos bancos digitais, reúne atualmente mais de 1,5 milhão de trabalhadores. A cada pesquisa realizada pelo DIEESE sobre o emprego bancário, a constatação é a diminuição do emprego bancário formal e o aumento da mão de obra no ramo financeiro, que, em sua grande maioria não possui qualquer representação sindical. Já constatamos empresas que prestam serviços bancários e registram os empregados como comerciários, como promotores de venda, amparados na alteração da Classificação Nacional de Atividades Econômicas – CNAE, uma decisão empresarial no mínimo suspeita. 

Organização desses trabalhadores. Algumas possibilidades: 

A CONTRAF – Confederação dos Trabalhadores/as do Ramo Financeiro – foi pensada e fundada exatamente com o propósito de organizar e representar esses trabalhadores. Percebendo a fragmentação da base formalmente bancária,com o surgimento e avanço da terceirização e dos correspondentes bancários, o sindicalismo bancário cutista, que antes se juntava nacionalmente na CNB – Confederação Nacional dos Bancários - sentiu a necessidade de ampliar os horizontes, sobretudo o horizonte da representação sindical e rumou para a formação e fundação da CONTRAF. A intenção era avançar para além do conceito de categoria profissional e partir para a construção do ramo financeiro. A ideia era boa, porém, não tínhamos a noção exata das gigantescas dificuldades dessa empreitada. Tanto é que as dificuldades permanecem até hoje e o ramo financeiro ainda é uma ideia em construção. 

Pouco se avançou na representação sindical desde a fundação da CONTRAF. 

Ainda focamos muito a ação sindical na categoria bancária. Chamamos nossa campanha salarial de “Campanha Nacional dos Bancários”. A comissão que negocia com o setor patronal (FENABAN) é conhecida como “Comando Nacional dos Bancários”. A Convenção Coletiva de Trabalho – CCT é um documento, fruto de negociação coletiva, que tem sua abrangência exclusiva para os trabalhadores de bancos. 

Temos um vasto campo para o crescimento do movimento sindical bancário. Representar essa imensidão de trabalhadores e trabalhadoras ainda é um longo e árduo caminho a ser percorrido. E um dos o principais entravesreside no próprio movimento sindical que perdeu muito da sua capacidade de organização e de atratividade. O trabalhador, cuja preocupação central é enfrentar a labuta, pensa, pragmaticamente, sobre qual vantagem em ter um sindicato, em ser sindicalizado. É a disputa diária que o movimento sindical tem que fazer. É a disputa pela formação política do trabalhador. E isso o movimento sindical não pode abrir mão sob pena de quase desaparecer, sobretudo para aqueles trabalhadores que contam apenas consigo próprio.  


N: Muito obrigado camarada Walcir!

 

terça-feira, 26 de setembro de 2023

História econômica, sim!

 Mercadoria, dinheiro, capital industrial, capital comercial, renda fundiária, capital financeiro: as diversas categorias econômicas que se sucedem dialeticamente, de forma a um só tempo lógica e cronológica, representam as variegadas relações de produção que os seres humanos contraem involuntariamente no curso da história, em que os indivíduos somente importam como vetores de tais relações.


Eis a obra magna de Karl Marx, O Capital, modelo universal de história econômica como exposição da essência de tal história e, sim, revelação do caráter reificado das relações entre os seres humanos, porquanto involuntárias tais relações: por isso, o Homo sapiens faz sua própria história, mas não de acordo com a sua vontade.


Mas olhem:


A história de nossa espécie somente sobrepujará esse jaez reificado quando a humanidade deixar o estágio de conceito abstrato e, superando as dissociações de classe e Estados nacionais, alcançar uma realidade concreta.


Mas isso não será tarefa de indivíduos isolados, mas da classe trabalhadora que, desprovida dos meios de produção, exibe um caráter universal e revolucionário, o que lhe confere aptidão para unificar a espécie humana.





Por Luís Fernando Franco Martins Ferreira, historiador.

sábado, 23 de setembro de 2023

Ovos de serpente

 Há cem anos, em 1923, a hiperinflação assolava a Alemanha, que algum tempo depois gestou o movimento de extrema direita nazista, cujos desdobramentos são amplamente conhecidos.


Hodiernamente, em 2023, a Argentina padece do mesmo problema econômico, e observa a gestação de um movimento político de extrema direita que encerra semelhanças bastante evidentes com o fascismo!


O dinheiro é um dos fundamentos econômicos axiais do modo capitalista de produção, e quando sua existência está em risco em determinado Estado nacional, o nacionalismo de extrema direita política parece encontrar solo fértil para seu florescimento!


Como diria Karl Marx, a história se repete…





Por Luís Fernando Franco Martins Ferreira, historiador.

Francisco

 São Francisco de Assis é uma figura histórica de dimensão e atualidade impressionantes:


Sua dedicação aos pobres é amplamente conhecida, mas ele também revelou-se um grande ecologista avant la lettre.


Sim, pois sua época também vivia uma crise ambiental de grande magnitude, com ampla devastação de florestas na Europa para expansão agropecuária!


Francisco combateu intensamente esse movimento de devastação ambiental na Idade Média.


Seu exemplo para nós marxistas é eloquente, em nossa época de emergência climática de potencial devastador.


Urge combinar hodiernamente, como o fez Francisco, a luta em favor dos pobres e a consciência ecológica!



Por Luís Fernando Franco Martins Ferreira, historiador.

sexta-feira, 22 de setembro de 2023

Assim na terra como no céu

 Muitos afirmam convictamente que o marxismo é ateu de forma ostensiva e militante.


Não tenho tanta certeza assim, conquanto esteja ciente do aforismo marxista consoante o qual a religião é o ópio do povo.


O Cristo, diante de Pôncio Pilatos, assegurou que seu reino não é deste mundo, e eu diria hipotética e simetricamente que Marx, diante de Deus no Céu, diria mais ou menos a mesma coisa.


É que os fundadores do socialismo científico simplesmente não se debruçaram de forma importante e conclusiva sobre o fenômeno religioso, cingindo-se com mais afinco na crítica da economia política e seus desdobramentos, isto é, voltaram sua atenção a coisas mais terrenas e profanas, de tal sorte que considero leviano assegurar que Marx e Engels eram militantemente ateus.


Mas olhem:


O mesmo Cristo também exortou “assim na terra como no céu”, o que complica um pouco, ou muito, as coisas para seus seguidores.




Por Luís Fernando Franco Martins Ferreira, historiador:

Lutas de classes e pautas identitárias

 No âmbito da esquerda política, parece que as lutas de classes sociais estão paulatinamente perdendo sua centralidade em favor das assim designadas pautas identitárias.


Tal fenômeno tornou-se agudo com o colapso da União Soviética e a atual emergência climática, que exibe um poder lesivo maior do que as crises financeiras cíclicas do capitalismo.


Nesse caso, fica evidente uma certa crise hodierna da tradição marxista!


Mas olhem:


Os fundadores do socialismo científico, pelo que me consta, não desaprovavam totalmente essas pautas identitárias, não negavam sua existência, mas enfatizavam o fato de que, em última instância, elas são epifenômenos das contradições do modo capitalista de produção e, nesse sentido, as pautas econômicas e as lutas de classes ainda encerram sua importância central.


Evidentemente, não constitui tarefa trivial coadunar e harmonizar politicamente as lutas de classes com as pautas identitárias, mas é preciso fazê-lo, sem olvidar o predomínio do âmbito econômico em última instância.


O grande e saudoso Professor Florestan Fernandes ensinou-nos a fazer isso com o problema racial no Brasil, cabe hoje fazer o mesmo com a emergência climática em orbe mundial.



Por Luís Fernando Franco Martins Ferreira, historiador.

terça-feira, 19 de setembro de 2023

O discurso na ONU

 Os mais desavisados, provavelmente entorpecidos pelo esquerdismo pueril, talvez critiquem um suposto jaez social-democrata do discurso do presidente Lula proferido hoje na Assembleia Geral da ONU, com sua defesa do Estado do bem-estar social como forma de mitigar desigualdades sócio-econômicas.


Nada mais infenso à verdade.


O atual presidente do Brasil não se cingiu à crítica da injustiça neoliberal, que aprofunda desigualdades sociais, mas revelou-se radical no pensamento (no sentido de atingir a raiz do problema) ao criticar a ineficiência do capitalismo.


Sim, pois tal ineficiência não se exibe nas crises financeiras cíclicas tão somente, mas hodiernamente revela-se na forma de uma catastrófica emergência climática de poder destrutivo maior do que as aludidas crises financeiras, eis que não se cuida de destruição criadora, mas de destruição pura e simples, tão somente, ceifadora definitiva de vidas e forças produtivas.


Vida longa ao presidente Lula, filho legítimo e líder inconteste da classe trabalhadora mundial!



Por Luís Fernando Franco Martins Ferreira, historiador.

Décimo aforismo

 A coleta do material empírico constitui, sem embargo, o primeiro estágio do conhecimento histórico, uma etapa incontornável, de fato.


Mas olhem:


A excessiva importância atribuída a esse estágio do método científico conduz invariavelmente ao detalhe narrativo e factual que pouco contribui à inteligibilidade histórica, conquanto possa encerrar interesse estético.



Por Luís Fernando Franco Martins Ferreira, historiador.

sábado, 16 de setembro de 2023

Hipóteses sobre acumulação primitiva de capital.

 1. Durante a Idade Moderna, os países ibéricos acumularam metais preciosos internamente e desenvolveram a manufatura em suas colônias ultramarinas, como a indústria açucareira com trabalho escravo no Brasil, cujos lucros, todavia, eram escoados para as respectivas metrópoles por intermédio do exclusivo colonial e do comércio de escravos;


2. No mesmo período, a Inglaterra, preterida na corrida colonialista, desenvolvia uma forte manufatura interna fundada no trabalho livre e observava a introdução do capital na produção agropecuária, com os correlatos cercamentos, bem assim acúmulo de metais preciosos mediante exportação de manufaturados para as nações predominantes do antigo sistema colonial;


3. A precoce introdução do capital no âmbito da produção, tanto agropecuária quanto manufatureira, bem assim o acúmulo de metais preciosos, atribuíram aos britânicos a dianteira no desenvolvimento das condições para a ulterior subsunção real do trabalho no capital com o advento da revolução industrial, esta precedida pela revolução puritana e também pela fundação do Banco da Inglaterra, já no século XVII.




Por Luís Fernando Franco Martins Ferreira, historiador.

Historiadores

 Karl Marx nutria admiração confessa por Charles Darwin, a ponto de fazer questão absoluta de encaminhar ao naturalista britânico um exemplar novo em folha de sua obra recém publicada à época, em 1867, o primeiro tomo de seu colossal projeto de crítica da economia política, a saber, O Capital.


Tal obra, juntamente com A evolução das espécies, constituem as duas mais importantes realizações no âmbito da historiografia mundial de todos os tempos:


Com efeito, Marx e Darwin não se contentam em exibir os acontecimentos que se sucedem no tempo, mas extraem a lógica subjacente a esta sucessão, o primeiro com relação à história humana, o segundo quanto à sucessão das espécies biológicas, vale dizer, a história natural.


Marx e Darwin são, definitivamente, os dois maiores historiadores de todos os tempos.




Por Luís Fernando Franco Martins Ferreira, historiador.

Um todo artístico

 Ápice da crítica da economia política, obra magna de Karl Marx, O Capital constitui também o ponto culminante da historiografia mundial, ao haurir a essência do evolver das civilizações com a exposição das sucessivas relações de produção contraídas involuntariamente pelos seres humanos.


Mas olhem:


Conquanto de grandes dimensões, tal obra seria apenas o primeiro livro de um total de seis planejados pelo respectivo autor, um projeto de arquitetura colossal que não foi concluído, lamentavelmente, por força do perfeccionismo do Mouro de Trier.


Marx denominou seu projeto de “um todo artístico”, muito embora esteja habitualmente inserido no elenco das obras de ciências econômicas.


Acontece que O Capital, consoante já antecipado acima, exibe-se obra típica de historiografia, e nesse sentido encerra também um jaez artístico, em consonância com a dualidade entre ciência e arte que caracteriza a disciplina da História.


Ora, se a ciência deve ser breve, a arte deve ser longa como a vida, daí a dimensão colossal do projeto marxiano, esse todo artístico que colima abroquelar todos os aspectos da produção e reprodução da vida material do Homo sapiens.



Por Luís Fernando Franco Martins Ferreira, historiador.

quinta-feira, 14 de setembro de 2023

Alvíssaras, alvíssaras!

 Foi com grata satisfação e enorme entusiasmo que recebi hoje, pelo camarada Lincoln Secco, a alvissareira notícia de que a Ubu Editora publicará no próximo ano a obra magna de Karl Marx, O Capital, na íntegra e em três volumes, na exímia tradução de Régis Barbosa e Flávio R. Kothe.


Cuida-se de monumento à ciência e à ação transformadora, que sobrepaira, sobranceira, no panteão inconteste das maiores obras já elaboradas pelo gênio humano.


Síntese genial da história econômica do Homo sapiens, apresenta a evolução a um só tempo lógica e cronológica de suas relações de produção, em que os indivíduos somente são chamados à colação enquanto representantes de tais relações, que arrostam constantemente as forças produtivas por elas mesmas liberadas, em movimento dialeticamente contraditório que insinua a necessidade histórica de superação do capital, objeto de investigação dessa obra de arte legada pelo grandíloquo Mouro de Trier.


Serão meses de grande expectativa.


Evoé!



Por Luís Fernando Franco Martins Ferreira, historiador.

quarta-feira, 13 de setembro de 2023

Um gigante da historiografia

 Faz-se mister solenidade, austeridade e recato para homenagear gigantes do pensamento, e este singelo espaço revela-se evidentemente demasiado modesto para entoar todos os encômios merecidos por um gênio do porte do professor Wilson do Nascimento Barbosa, mas ainda assim ousarei dizer breves locuções acerca desta imponente figura da historiografia brasileira.


Fui seu aluno nos pródromos da década de 1990, na disciplina de história moderna na Universidade de São Paulo, e logo na primeira aula de tal curso fui atingido por uma verdadeira martelada contra a vaga anticientífica que de certa forma se insinuava nos corredores do respectivo departamento e que me seduziu por um lapso temporal:


Ao tratar da Reforma Protestante, o professor Wilson estabeleceu uma relação intrínseca entre tal movimento histórico e a nova divisão do trabalho que se difundia na Europa com o advento da subsunção formal do trabalho no capital ensejada pelo advento da manufatura, com a respectiva ascensão da classe social da burguesia fabril que posteriormente lideraria a revolução industrial do século XVIII.


O professor Wilson ensina, destarte, a pensar em profundidade sobre o evento histórico, com a radicalidade necessária ao seu desvendamento científico, isto é, um pensamento que alcança a raiz dos acontecimentos empiricamente observáveis.


Lição indelével!


Muito obrigado, professor Wilson!





Por Luís Fernando Franco Martins Ferreira.

Bosquejo acerca de economia e psicanálise.

 Os dois vértices da produção e reprodução material da vida humana neste planeta consistem em:


1. A produção econômica;


2. A reprodução sexuada.


O primeiro vértice foi investigado em profundidade e radicalidade pelos fundadores do socialismo científico, pioneiros do materialismo histórico, Marx e Engels, que descortinaram a lógica materialista e dialética da história das civilizações, sobrepujando destarte a história do indivíduo, o qual somente se manifesta na obra de tais autores enquanto representante de relações de produção.


O segundo vértice foi investigado pioneiramente por Sigmund Freud, o qual, todavia, cingiu-se à história do indivíduo e suas manifestações de jaez mais propriamente mental, sem, contudo, alcançar as repercussões demográficas desse vértice, sendo certo que, enquanto neurologista, teria contribuído mais eficientemente à ciência caso tivesse se debruçado nas interações entre o cérebro e a fisiologia dos demais órgãos humanos.


Cabe, pois, revisitar o segundo vértice a partir de prisma demográfico.



Por Luís Fernando Franco Martins Ferreira, historiador.

terça-feira, 12 de setembro de 2023

PRÁXIS

 1. Quando mencionamos a prática política, no texto imediatamente precedente, referimo-nos àquilo que a tradição marxista costumeiramente denomina práxis, conceito que abroquela tanto a ação pura, por vezes heróica, quanto a formulação puramente teórica, desde que inclinada verdadeiramente à superação do modo capitalista de produção;


2. Essa tradição marxista também alude à contradição entre as relações de produção e as forças produtivas como indicativo de esgotamento dos sucessivos modos de produção no curso da história, mas não há nela parâmetros definidos para o momento exato desse esgotamento, de tal sorte que as crises cíclicas do capitalismo revelam-se típicas dessa contradição, mas não se sabe ao certo se haverá uma crise definitiva desse modo de produção, sendo certo, portanto, que à vanguarda proletária cabe esgrimir a práxis revolucionária desde sempre, ainda que tenhamos que aguardar muitos séculos de sobrevida desse sistema econômico ineficiente e injusto.



Por Luís Fernando Franco Martins Ferreira, historiador.

domingo, 10 de setembro de 2023

Pobre de direita

 Cada época da história propõe a si própria os problemas que pode resolver e cujas tarefas cabem a seus contemporâneos, mas nem todos os contemporâneos propõem a si próprios a prática para resolver tais problemas.


Assim que, nada obstante a necessidade de sobrepujar o modo capitalista de produção e fundar uma nova ordem social desprovida de fraturas provocadas pelas lutas de classes, nem todos agem consoante tal necessidade, nem mesmo entre os mais interessados na superação do capitalismo, vale dizer, o proletariado.


Há pobres de direita pois, conquanto todos possam ter acesso à mencionada necessidade histórica, cada indivíduo ainda encerra o livre arbítrio de agir como bem lhe aprouver, até mesmo contra seus interesses, ou os interesses da respectiva classe social.


Mas olhem:


Não é a consciência de classe que determina se alguém é de direita ou esquerda no âmbito político, mas sua efetiva prática diante da época em que vive.




Por Luís Fernando Franco Martins Ferreira, historiador.

sexta-feira, 8 de setembro de 2023

Marx, ética e estética.

 Alfred North Whitehead revelou-se sábio ao postular que toda a filosofia ocidental resume-se a glosas marginais à obra de Platão, o fundador do pensamento dialético.


Como epígono platônico, Karl Marx buscou a essência da história humana, conduzindo a dialética a suas últimas consequências, ao mostrar o evolver lógico e cronológico das relações de produção da vida material humana, máxime em sua obra magna O Capital, que bem poderia intitular-se Ética!


Mas olhem:


Esta Ética de Marx colima a Estética, vale dizer, a fruição e gozo pleno, por todos, das possibilidades que a vida humana encerra, em uma vindoura sociedade despojada das fraturas de classes sociais!



Por Luís Fernando Franco Martins Ferreira, historiador.

quarta-feira, 6 de setembro de 2023

Os despojos da morte

 Na belíssima película cinematográfica intitulada “A escavação”, exibe-se a teoria de que a morte não encerra relevância social, mas tão somente individual, porquanto a história prossegue inexorável e inabalável diante do ocaso do indivíduo, sendo certo que ao arqueólogo cabe revolver os vestígios fúnebres da impassível deusa Clio.


Na reprodução sexuada, cada indivíduo aspira à imortalidade da espécie, ciente, todavia, de que não participará de suas glórias vindouras.


Mas olhem:


Essa espécie também experimentará seu crepúsculo, de tal sorte que, mais uma vez, postulo que a ontogênese recapitula a filogênese, eis que a morte das civilizações simula aquela dos indivíduos.




Por Luís Fernando Franco Martins Ferreira, historiador.

terça-feira, 5 de setembro de 2023

Nono aforismo

 Lênin postulava a supremacia da política sobre a economia, o que parece contradizer um certo viés de determinismo econômico encontradiço na tradição marxista.


Mas Lênin estava correto, pois a política revela-se como o meio por excelência apto a sobrepujar o fenômeno da alienação, resultante das determinações estruturais do capital sobre os seres humanos.



Por Luís Fernando Franco Martins Ferreira, historiador.

segunda-feira, 4 de setembro de 2023

Oitavo aforismo

 Conquanto aparentemente abstrata, a matemática exibe-se como a mais objetiva das ciências, na qual a teoria importa mais que a respectiva autoria, ao contrário das ciências assim designadas “humanas”, máxime no direito, onde o argumento de autoridade ainda hoje é adotado em determinadas circunstâncias.


Observe-se, por oportuno, que o nascedouro dos números coincide com o advento da relação de produção consubstanciada na mercadoria, cujo valor determina-se pelo tempo de trabalho abstrato necessário à sua produção.




Por Luís Fernando Franco Martins Ferreira, historiador.