sábado, 17 de maio de 2025

ECONOMIA E POLÍTICA

Ciente do jaez complexo e controverso do tema em testilha, não posso esquivar-me, todavia, de tecer alguns comentários bastante incipientes a propósito. 

A exímia estudiosa Shoshana Zuboff recentemente cunhou o conceito de capitalismo de vigilância para denominar o que entende representar uma nova etapa no modo capitalista de produção, caracterizado por utilização de dados para dirigir o comportamento dos cidadãos nas variegadas esferas de sua vida, tanto políticas quanto econômicas. 

Honestamente, não sei se logrei compreender bem tal categoria, mas quer me parecer que se nota uma certa influência do conceito de poder esgrimido por Michel Foucault, em que a política predomina sobre a economia. 

Entendo, entretanto, que enquanto o problema da produção e reprodução da vida material humana em sociedade não for devidamente resolvido, a questão da distribuição do produto econômico entre as distintas classes sociais remanescerá predominante, de tal sorte que a economia continuará prevalecendo sobre a política, cabendo destacar que a obtenção do lucro permanecerá dirigindo eventual tentativa de determinação do comportamento individual.

Nada obstante, a controvérsia segue complexa, pois o próprio Lênin argumentava que a política é mais importante do que a economia, mas, nota bene, este dirigente político liderava um partido proletário em processo revolucionário, e sabemos que o proletariado constitui a única classe social apta a resolver aquele problema da produção e distribuição material da sociedade, acima aludido, isto é, a única força social e histórica hábil a limpar "toda a velha merda", na locução sardônica do próprio Karl Marx. 

Enfim, um bom e necessário debate.





por  LUÍS FERNANDO FRANCO MARTINS FERREIRA, historiador.  

MÚSICA: O FRÉDÉRIC FRANÇOIS CHOPIN DE BRAD MEHLDAU (em homenagem ao camarada Sérgio Domingues, notável divulgador marxista)

Quase dois séculos separam os pianistas Frédéric François Chopin e Brad Mehldau, mas este último presta um relevante e esteticamente agradável tributo ao primeiro na música que representa uma faixa de seu álbum "The art of the trio", intitulada "Lament for Linus"

Nesta faixa, Brad Mehldau reinventa o estudo de Chopin intitulado "Lament", de tal sorte que extrai a essência da linha melódica de aludido estudo para em seguida desenvolvê-la de forma improvisada, como é sintomático do estilo jazzístico, haurindo um efeito de grande impacto estético.

Outrossim, em uma analogia livre com o desenvolvimento científico, aventaríamos que este procedimento de Mehldau assemelha-se a uma lapidação de dada hipótese mediante o método científico, pois toma o estudo fragmentário de Chopin e transcende sua incipiência, expurgando tudo o que lhe é acessório e acidental para lhe conferir um jaez mais objetivo e hialino, apontando ainda os desdobramentos que lhe são embrionários. 

Indo um pouco mais além, ventilaríamos também uma analogia com o próprio desenvolvimento histórico das espécies biológicas e dos modos de produção sociais, que se caracteriza por certo aperfeiçoamento e desdobramento de estruturas prévias e menos complexas.

Sem embargo, o movimento que ascende do abstrato ao concreto, como postulado por Karl Marx, parece incidir sobre todas as esferas do real, sendo certo que o concreto é síntese de múltiplas determinações, unidade do diverso. 




por LUÍS FERNANDO FRANCO MARTINS FERREIRA, historiador.     

sexta-feira, 16 de maio de 2025

Breve estudo em homenagem ao camarada Maurício Barbara

No livro primeiro de O Capital de Karl Marx, o dinheiro é sinônimo de circulação de mercadorias, mas esse autor não investigou como a burguesia comercial antediluviana lucrava com as diferenças de preços das mercadorias, especialmente no antigo sistema colonial, o qual foi dissecado por Fernando Novais.


Com o advento do capital propriamente dito, isto é, a inserção do dinheiro na produção direta das mercadorias, exsurge o problema do declínio tendencial da taxa de lucro, sendo possível que a aceleração da circulação de capital contraponha-se a tal declínio, mediante redução dos faux frais desse processo de circulação de capital, bem assim o aumento da massa de lucro auferida em dado lapso temporal.


As informações sobre produção e consumo representam item essencial para esta aceleração da circulação de capital, máxime para alocação de recursos pelo capital financeiro, o que pode ter estimulado a revolução digital ou microeletrônica hodierna, pois a aceleração da prospecção de informações sobre produção e consumo econômicos parece acelerar a circulação de capital.


De outro bordo, as melhorias nas comunicações e, portanto, também na difusão das informações pelas telecomunicações, máxime pela internet, substituem em grande medida as necessidades de deslocamento físico de pessoas e mercadorias, em detrimento do setor econômico dos transportes, verbi gratia, o que se manifesta, por exemplo, na decadência do Cinturão da Ferrugem nos Estados Unidos da América, que foi substituído pelo Vale do Silício como locomotiva econômica daquele país.


Hipóteses sub judice.

Maurício Barbara, destacado intelectual do Núcleo de Estudos do Capital, é doutorando em economia pela UFBA.




Por Luís Fernando Franco Martins Ferreira, historiador.

terça-feira, 13 de maio de 2025

CIÊNCIA E POLÍTICA

Na produção e reprodução de sua vida material em sociedade, os seres humanos contraem entre si relações de produção, ou de propriedade, heterônomas e alienadas, que os governam à sua revelia e dividem a espécie do homo sapiens em classes sociais irremediavelmente antagônicas, representadas pelo capital (burguesia) e pelo trabalho (proletariado).

Tal fenômeno da alienação, necessariamente acompanhado pela divisão da humanidade em classes sociais antagônicas, é o responsável direto pela cesura entre o universo empírico da prática e o âmbito racional da ciência, de tal sorte que se faz mister uma metodologia científica rigorosa e controlada para que o pensamento transcenda tal cesura e alcance o conhecimento epistemologicamente válido, pois a prática social, a saber, o trabalho sob a égide do capital, por si mesma não conduz a este conhecimento.

Mas a divisão em classes sociais não implica em relativismo científico ou epistemológico, pois o proletariado, em seu aspecto potencialmente universal e apto a superar historicamente essa divisão em classes, encerra também a possibilidade, por intermédio de seus intelectuais orgânicos, de alcançar o conhecimento científico hábil a orientar a prática política capaz de concretizar a aludida superação da alienação e da divisão classista. 

Sob a ótica histórica, quando o dinheiro transforma-se em capital propriamente dito, ele inaugura e produz a força de trabalho como mercadoria sujeita à compra e venda, mas tal situação representa em si mesma uma oposição contraditória entre o ser humano e sua aptidão para o trabalho, uma divisão artificialmente imposta pelo capital que não tem como sustentar-se indefinidamente, e que alimenta uma massa de trabalhadores, ou de forças de trabalho como mercadorias, constitutiva de uma classe social que se define como uma potência apta a resolver tal contradição.         

Portanto, a ciência produzida no âmago do proletariado, por seus intelectuais orgânicos, encerra o condão de orientar e informar a prática política potencialmente apta a superar o modo capitalista de produção e a própria divisão entre classes sociais que lhe é ínsita: tal ciência foi denominada socialismo científico e um dos seus pressupostos consiste na asserção de que é na prática que o ser humano comprova a veracidade de seu pensamento. 




por LUÍS FERNANDO FRANCO MARTINS FERREIRA, historiador.    

domingo, 11 de maio de 2025

DIALÉTICA E REPRODUÇÃO

Parece lícito aventar, com efeito, que a produção e reprodução da vida material humana bifurca-se em dois segmentos complementares, a saber: pela reprodução sexuada, preserva-se a espécie humana e, pelo trabalho, pereniza-se o modo de produção, sendo certo que, se este último foi dissecado por Karl Marx, a noção de espécie biológica foi investigada em profundidade por Charles Darwin.

Mas a continuidade do modo de produção capitalista, especificamente, bifurca-se, por seu turno, em classes sociais distintas e antagônicas, representadas pelo trabalho (proletariado) e pelo capital (burguesia), de tal sorte que o movimento diacrônico de preservação temporal deste modo de produção é garantido dialética e precisamente pela interação entre tais classes opostas. 

De forma simétrica, a preservação da espécie humana pela reprodução sexuada bifurca-se em gêneros ou sexos opostos, a saber, o feminino e o masculino, cabendo destacar ainda que o movimento diacrônico de continuidade temporal desta espécie é garantido dialeticamente pela interação entre tais gêneros feminino e masculino.

Todavia, as evidências empíricas mostram que a reprodução das espécies conduz, dialeticamente, ao surgimento de novas e mais complexas espécies, numa alteração qualitativa percucientemente investigada por Charles Darwin. 

Simetricamente, ainda, as evidências empíricas também mostram que os distintos modos de produção sucedem-se na história, de tal forma que é previsível e esperado que o modo capitalista de produção seja dialeticamente superado por outro, qualitativamente distinto e superior. 



por LUÍS FERNANDO FRANCO MARTINS FERREIRA, historiador. 

sábado, 10 de maio de 2025

L. S. LOWRY

A produção e reprodução da vida material humana em sociedade realiza-se por duas vertentes angulares, a saber: a reprodução sexuada e o trabalho.

Mas tanto o universo da reprodução sexuada quanto o mundo do trabalho pareciam demasiado indignos e desagradavelmente feios aos olhos da arte plástica do romantismo pictórico, que os submergia na representação do amor lírico e da natureza em suas telas assépticas. 

O pintor britânico Laurence Stephen Lowry, no entanto, parece ter sido um dos arautos infensos a essa modalidade romântica da representação pictórica da realidade social, ao retratar em suas telas precisamente o universo das fábricas e dos trabalhadores da indústria de seu país.

Malgrado ainda restrito a certo figurativismo que alguns classificaram até mesmo como naif, sua obra antolha-se-nos mais revolucionária do que a ramificação de jaez formalista que vai dos impressionistas ao abstracionismo, passando por Van Gogh e Picasso, porquanto, ao contrário do racionalismo destes, Lowry dirige-se diretamente ao coração dos trabalhadores, encerrando o condão mais de comover do que de fazer pensar abstratamente. 

Seria a obra de Lowry uma espécie ou vertente de realismo socialista ocidental? 




por LUÍS FERNANDO FRANCO MARTINS FERREIRA, historiador.  

segunda-feira, 5 de maio de 2025

RESILIÊNCIA CAPITALISTA

Em caráter ainda bastante incipiente e conjectural, ouso ventilar que o capitalismo concorrencial do século XIX arrostava duas frentes de óbices à acumulação irrestrita de capital consistentes no seguinte:

No âmbito do processo de produção de capital, a concorrência conduzia ao aumento da composição orgânica do capital colimando a elevação da força produtiva do trabalho para redução dos preços, o que, por seu turno, provocava um declínio tendencial da taxa de lucro do mesmo capital.

Na orbe do processo de circulação de capital, esta mesma concorrência engendrava um entrave consistente no descompasso entre oferta e demanda econômicas, com dificultar a realização da mais-valia. 

O capitalismo monopolista do século XX, de certa forma, resolveu em boa medida tais óbices da fase concorrencial, pois eliminou a concorrência e, por conseguinte, a necessidade da aumentar a composição orgânica do capital para reduzir preços, removendo o espectro da queda tendencial da taxa de lucro. 

De outro bordo, mediante a possibilidade de imposição de preços administrados, os monopólios ensejaram de certa forma coadunar, ao menos em determinado setor da economia, a oferta e a demanda econômicas, facilitando a realização da mais-valia.

Hipóteses sub judice. 




por LUÍS FERNANDO FRANCO MARTINS FERREIRA, historiador.