domingo, 6 de abril de 2025

MEMÓRIA, HISTÓRIA HUMANA E HISTÓRIA NATURAL.

Vimos no texto imediatamente precedente, aqui publicado, que somos dotados de memória e, por esse motivo, nossa percepção subjetiva do tempo exibe-se cumulativa, de modo que temos a sensação de que o tempo que passa vai sendo somado, resultando em nossa idade, que é o acúmulo ou soma dos anos passados desde o nascimento, e nossa identidade individual. 

Mas tal caráter cumulativo da memória reproduz no âmbito do pensamento o próprio processo cumulativo da história, seja ela humana ou natural, senão vejamos:

Consoante preconiza o materialismo histórico e dialético de Marx e Engels, as categorias econômicas que se sucedem na história são cumulativas, como exposto na obra O Capital, verbi gratia, em que a categoria do dinheiro incorpora e supera a categoria historicamente antecedente da mercadoria, enquanto a categoria do capital incorpora e supera a categoria historicamente precedente do dinheiro. 

Simetricamente, a teoria da evolução das espécies biológicas, suscitada por Darwin, cientista mui admirado por Marx, também se mostra cumulativa, de tal sorte que as espécies mais evoluídas na história natural incorporam e superam as estruturas e órgãos das espécies antecedentes e menos desenvolvidas, consoante o brocardo: "a anatomia do homem é a chave da anatomia do macaco"

Logo, indivíduos humanos, modos de produção e espécies biológicas oferecem simetrias flagrantes de desenvolvimento ao longo do tempo. 




por LUÍS FERNANDO FRANCO MARTINS FERREIRA, historiador.  

sábado, 5 de abril de 2025

MEMÓRIA E RELATIVIDADE, OU BREVÍSSIMO ENSAIO DE PSICOLOGIA.

Quer nos parecer que não é apenas no âmbito do mundo físico objetivo que vigora uma teoria da relatividade, de tal sorte que sou compelido a acreditar, com a convicção própria das conjecturas, em uma certa relatividade subjetiva, ou psicológica.

Sem embargo, somos dotados de memória e, portanto, o tempo subjetivamente percebido é cumulativo, o que forja a sensação de identidade individual apesar do envelhecimento corporal: por isso dizemos, quando nos perguntam a idade, que temos, digamos, cinquenta e quatro anos de idade, isto é, uma soma, vale dizer, um acúmulo dos anos do calendário que já se passaram desde o nosso nascimento. 

Também por isso, nossa percepção subjetiva da passagem ou velocidade do tempo exibe-se relativa à nossa idade, de tal modo que quanto mais idosos, mais rápido o tempo parece correr, isto é, mais veloz parece o curso do tempo: com efeito, para uma criança de um ano de idade, um período seis meses corresponde a metade do seu tempo de vida, ao passo que, para uma pessoa de sessenta anos de idade, um semestre corresponde a apenas um cento e vinte avos de seu tempo de vida, sendo certo que a velocidade do tempo subjetivamente percebida é tanto maior quanto mais idoso o sujeito considerado. 

Denominaria isto, provisoriamente, de relatividade subjetiva. 

Conjecturas sub judice. 



por LUÍS FERNANDO FRANCO MARTINS FERREIRA, historiador.  

RENDEZ-VOUS AVEC POL POT

A película cinematográfica de título em testilha exibe-se muito eficiente como denúncia histórica do genocídio perpetrado pelo Khmer Vermelho no Camboja durante o governo de Pol Pot, mas mostra-se sofrível como tentativa de elucidação da história. 

Sem embargo, esse líder político autodenominado comunista empreendeu uma leitura enviesada do materialismo histórico de Marx e Engels, senão vejamos:

Concedendo mais importância às relações de produção do que às forças produtivas, bem assim empreendendo uma crítica acerba da noção de progresso ínsita ao positivismo filosófico de matriz ocidental, Pol Pot identificou no capitalismo um fenômeno tipicamente urbano, de tal sorte que promoveu um movimento de agrarização acelerada da economia, inclusive com esvaziamento das cidades e abolição do dinheiro, colimando atingir um estágio de comunismo primitivo.

Nada justifica um genocídio (decorrente de uma situação bélica permanente e paranoica no país, segundo o próprio Khmer Vermelho), mas tal crítica do progresso material propiciado pelo desenvolvimento histórico das forças produtivas não é de todo tresloucada, contando com adeptos ilustres, como Walter Benjamin por exemplo, se bem que o filme em comento furta-se a encetar tal tipo de discussão, quedando perfunctório. 

Se o progresso material certamente não é garantia absoluta de felicidade humana, máxime considerando a hodierna crise ecológica, tampouco parece exequível retroagir a um estado de comunismo primitivo. 

Bom debate que a película não efetua. 




por LUÍS FERNANDO FRANCO MARTINS FERREIRA, historiador. 

quinta-feira, 3 de abril de 2025

ESPECULAÇÕES SOBRE O CAPÍTULO DÉCIMO DO LIVRO PRIMEIRO DE O CAPITAL.

Karl Marx oferece, no capítulo décimo do livro primeiro de sua obra magna, uma resolução para um certo paradoxo de sua teoria econômica, a saber: o que moveria o capitalista individual a buscar continuamente um aumento da força produtiva do trabalho, mediante investimento em capital fixo e decorrente aumento da composição orgânica do seu capital, se isto conduz tendencialmente a um declínio de sua taxa de lucro?

Ora, diz Marx, tal aumento da força produtiva do trabalho conduz a uma redução do tempo de trabalho necessário para que o capitalista individual produza sua mercadoria individualmente considerada, de tal sorte que ele pode então reduzir o preço de tal mercadoria e derrotar, portanto, a concorrência, com favorecer o processo de centralização de capital e formação de monopólio, o que embota o aguilhão concorrencial e permite a imposição de preços administrados, afastando, destarte, o espectro da lei tendencial da queda da taxa de lucro.

Faz-se mister, todavia, observar que o capital fixo também transfere seu valor, no processo de circulação do capital total, para a mercadoria individual produzida pelo capitalista individual, de sorte que disso se dessume uma lei econômica cujo enunciado poderia ser:

"Para que haja efetiva diminuição do preço individual da mercadoria mediante aumento da produtividade decorrente de investimento em capital fixo, o incremento da força produtiva do trabalho deve ser tal que compense o acréscimo de valor paulatinamente transferido aos produtos pela circulação de tal capital fixo"






por LUÍS FERNANDO FRANCO MARTINS FERREIRA, historiador.   

quarta-feira, 2 de abril de 2025

MARGINALISMO, FASE MONOPOLISTA DA TEORIA DO VALOR.

Habitualmente, a teoria marxista do valor econômico vem associada à classe trabalhadora, ao passo que a teoria marginalista do valor econômico vem associada à classe capitalista, de tal sorte que seriam mutuamente excludentes do ponto de vista epistemológico. 

Discordo em parte. 

A teoria marxista do valor, na verdade, é característica da fase histórica do capitalismo concorrencial, quando os lucros são hauridos basicamente da extração da mais-valia no âmago do processo de produção de capital, enquanto o marginalismo é característico da fase monopolista do capitalismo, quando os lucros são também, mas não somente, extraídos no processo de circulação de capital mediante imposição de preços administrados.

Faz-se mister, todavia, aduzir que, malgrado sejam teorias complementares, nos termos acima declinados, o marxismo determina o valor das mercadorias, enquanto o marginalismo detemina o respectivo preço. 

Conjecturas sub judice. 





por LUÍS FERNANDO FRANCO MARTINS FERREIRA, historiador.  

MONOPÓLIOS E PREÇOS

Parece lícito esgrimir que, nas fases mercantilista e monopolista da história econômica do capitalismo, os lucros são obtidos em grande medida na esfera da circulação de mercadorias ou de capital, mediante a imposição de preços administrados, ensejados pelo jaez exclusivista ínsito ao monopólio, de tal sorte que não há que se cogitar em extração de lucros pela produção de sobrevalor ou mais-valia, mas em apropriação de valores já produzidos, com vantagem de uma parte, em detrimento de outra, envolvidas nesta circulação de mercadorias ou de capital.

De tal asserção não resulta que no capitalismo monopolista inexista a extração de mais-valia no processo de produção de capital, mas sim que tal mais-valia é complementada na esfera da circulação de capital mediante estes preços administrados, com realização de lucros extraordinários.

Tema a desenvolver. 




por LUÍS FERNANDO FRANCO MARTINS FERREIRA, historiador.  

terça-feira, 1 de abril de 2025

MONOPÓLIO E CONCORRÊNCIA NA HISTÓRIA ECONÔMICA

1. No período histórico do capitalismo mercantilista, na época moderna em que se observa a subsunção meramente formal do trabalho no capital, na indústria manufatureira, os lucros são basicamente hauridos no processo de circulação de capital, mediante o suporte dos monopólios e do exclusivo colonial (na nomenclatura adotada por Fernando Novais), mantidos pelo Estado absolutista e pelo antigo sistema colonial, máxime pelo mecanismo das diferenças de preços entre metrópole e colônia. 

2. No período histórico do capitalismo concorrencial, em que se observa o advento da maquinaria e grande indústria e a respectiva subsunção real do trabalho no capital, os lucros são hauridos basicamente no processo de produção de capital, mediante a extração da mais-valia absoluta e relativa, descritas por Karl Marx em sua monumental obra intitulada O Capital. 

3. No período histórico do capitalismo monopolista ou imperialismo, tão bem investigado por Lenin, Luxemburgo e respectivos discípulos como Sweezy e Baran, os lucros voltam a ser hauridos basicamente no processo de circulação de capital, mediante a imposição de preços administrados. 

4. Infere-se, do exposto, que há um certo pêndulo histórico entre monopólio e concorrência na história econômica do capitalismo. 




por LUÍS FERNANDO FRANCO MARTINS FERREIRA, historiador.