Em sua coluna semanal na edição de hoje do jornal Folha de São Paulo, o professor Delfim Netto, de maneira bastante instigante, deduz o quanto segue:
"Por outro lado, o Estado presta serviços que aumentam a 'renda' e o bem-estar de quem os recebe. Essa é a beleza do estudo da receita e dos gastos públicos, onde se procura determinar quem, nesse jogo, são os 'ganhadores' (aqueles cujo bem-estar recebido dos serviços do governo excede o que perderam quando recolheram o imposto) e os 'perdedores', onde acontece o contrário"
Agora exoro licença para remeter meus eventuais leitores às minhas divagações sobre história comparada publicadas neste blog aos 20 de julho do ano corrente: com efeito, faltou conceituar, nesse caso, consumo produtivo e improdutivo, questão que reputo de alta complexidade. Permitam-me, todavia, arriscar alguns palpites de leigo e diletante em economia sobre o tema:
Eu associaria consumo produtivo aos capitais constante e variável na acepção de Karl Marx, de tal sorte que toda a produção social reinvestida na forma de capital constante ou capital variável constituiria consumo produtivo. Nesse diapasão, o consumo suntuário da classe proprietária dos meios de produção, verbi gratia, seria improdutivo, ao passo que o consumo dos trabalhadores fabris para sua própria subsistência, por seu turno, seria consumo produtivo.
Mas o que dizer do consumo daquilo que eu designei "Estado burocrático-militar"? Seria ele totalmente improdutivo, como afirmei?
Parece-me que não, pois, inspirado na asserção do professor Delfim Netto acima reproduzida, eu diria que o Estado pode prestar serviços que aumentam a "renda" e o bem-estar, por exemplo, dos trabalhadores fabris, confundindo-se, portanto, com o consumo produtivo consubstanciado no capital variável.
No que pertine mais diretamente ao problema da tributação, por seu turno, o assunto do conflito distributivo parece cada vez mais complexo.
Observe-se que uma parcela da produção da classe trabalhadora fabril constitui a mais-valia, em parte apropriada improdutivamente pela classe dos proprietários dos meios de produção com seu consumo suntuário; por via dos tributos incidentes sobre tal consumo suntuário, uma parte é consumida pelo Estado e retorna, como tal, integralmente ao consumo improdutivo desta mesma classe, na forma de serviços a ela dirigidos, inclusive os serviços de segurança interna e externa, os quais se destinam, em última instância, a garantir a propriedade privada dos meios de produção desta classe.
Mas os tributos que recaem sobre o consumo de subsistência da classe trabalhadora fabril incidem diretamente no salário, isto é, no capital variável, sendo certo que uma parte lhe é restituída na forma de serviços a ela dirigidos, mas outra parte é sempre improdutivamente consumida pelo Estado na forma da segurança interna e externa, as quais, em última instância, nos termos acima deduzidos, somente interessam à classe dos proprietários dos meios de produção.
Logo, nos termos adotados pelo professor Delfim Netto, os "ganhadores" são sempre os proprietários dos meios de produção, eis que tudo o que pagam como tributos lhes é restituído pelo Estado, ao passo que os "perdedores" são sempre os trabalhadores fabris, já que uma parcela do que pagam em tributos sempre lhe é extorquida na forma de serviços que só interessam, ainda que em última instância, à classe proprietária dos meios de produção.
Aguardo vossas valorosas considerações, já que o texto pode parecer meio confuso.
(por LUIS FERNANDO FRANCO MARTINS FERREIRA, historiador)
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