Provavelmente incorrerei em repetições nesta continuação das reflexões precedentes, mas a repetição consiste em elemento constitutivo do próprio exame da matéria.
Sempre com inspiração no conjunto monumental da obra de Karl Marx e Friedrich Engels, reiteramos que, na produção e reprodução de sua vida material, os seres humanos contraem relações entre si que independem de sua vontade e escapam, portanto, de seu controle: a forma-mercadoria constitui uma relação social desta espécie, por intermédio da qual os produtos do trabalho humano concreto, aptos a satisfazer necessidades humanas também concretas, convolam-se em mera "gelatina" de trabalho humano abstrato, o que lhes garante o intercâmbio recíproco. Nisso radica o duplo caráter da mercadoria, dissociada entre seu valor de uso e seu valor de troca.
Quando a forma social e histórica da mercadoria suplanta o âmbito da mera circulação ou consumo, assumindo a produção social, ela dissocia o trabalhador de seus meios de produção, convolando os próprios meios de produção e a força de trabalho em mercadorias. Nisso reside uma transfiguração substancial, pois agora ao capital, a saber, a propriedade privada dos meios de produção como mercadorias, interessa somente o valor de troca, ou simplesmente "valor" das mercadorias, de tal forma que sua aptidão para satisfazer necessidades humanas concretas resta obliterada, o que se manifesta na crescente padronização e repetição das mesmas mercadorias, simetricamente à crescente padronização e repetição do trabalho, processo este que se intensifica com a concentração e centralização de capital, cujo apogeu se manifesta no imperialismo hodierno.
Destarte, a mercadoria, esta forma social e histórica que se revela uma abstração hipostasiada, vai crescentemente apartando-se do real escopo da produção e reprodução da vida material da sociedade, que consiste na satisfação das necessidades humanas concretas, para adstringir-se à valorização de valor ínsita ao capital.
Urge, pois, a superação da forma-mercadoria e sua manifestação máxima, o capital, por uma formação social em que, reiteramos, a divisa seja atribuir a cada um segundo suas necessidades concretas, com exigir também de cada um segundo suas possibilidades concretas.
Tal superação somente pode estabelecer-se, por óbvio, mediante as formas concretas assumidas pelas lutas de classes.
(por LUIS FERNANDO FRANCO MARTINS FERREIRA, historiador)
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