domingo, 7 de maio de 2023

Inflação e declínio tendencial da taxa de lucro

Parto de duas hipóteses correlatas, a saber:

1. Consoante se dessume do texto imediatamente precedente deste portal eletrônico, publicado aos 04 de maio do corrente ano, a difusão e socialização da adoção industrial da inovação tecnológica, desde que apta a promover um aumento da composição orgânica do capital, conduz a um declínio tendencial da taxa de lucro, o qual é arrostado e neutralizado mediante aumento generalizado dos preços das mercadorias, provocando inflação;

2. Consoante se dessume do texto intitulado “Revoluções tecnológicas e ciclos seculares”, também publicado neste portal eletrônico, divisam-se três grandes revoluções industriais ao longo da história do modo capitalista de produção: a revolução industrial inglesa do final do século XVIII, caracterizada pela introdução do motor a vapor; a revolução industrial do final do século XIX, notável pelo uso fabril da energia elétrica; e, por derradeiro, a hodierna revolução microeletrônica.

Tais hipóteses foram corroboradas por dados empíricos sobre a evolução dos preços nos Estados Unidos da América e na Grã-Bretanha, os quais, estatisticamente tratados, exibem os ápices desses preços nos períodos de 1810-1815 e 1915-1920, vale dizer, aproximadamente quarenta anos após o início das duas primeiras grandes revoluções industriais, respectivamente, quando as inovações tecnológicas nelas envolvidas consolidaram-se e se difundiram.

Tais dados sobre preços foram colhidos de duas fontes, a saber:

1. O artigo de Nikolai Kondratiev intitulado “The long waves in economic life”, que exibe tais dados no primeiro gráfico do texto, inserido no quarto capítulo respectivo;

2. O opúsculo de Pierre Bezbakh intitulado “Inflation et desinflation”, no primeiro gráfico, na página 10 da obra.

Conquanto eu não disponha aqui de dados sobre preços posteriores à década de 1920, parece notória também a ocorrência de um aumento da inflação mundial na corrente década de 2020, notadamente após o início da guerra da Ucrânia, ou seja, também quarenta anos aproximadamente depois dos pródromos da hodierna revolução microeletrônica, numa simetria evidente com o que se constatou nos anos 1810 e 1920.

Faz-se mister deduzir então a singela e provisória equação matemática em que x=-y, onde x é a inflação apurada em dado período de tempo e y é o declínio da taxa de lucro no mesmo período.

Por derradeiro, impende aduzir que, consoante a demonstração empírica das hipóteses aqui ventiladas, maxime quanto à primeira hipótese, a elevação dos juros não encerra o condão de reduzir a inflação, pois, ao diminuir ainda mais a taxa de lucro do capital, pode provocar na verdade um incremento dos índices inflacionários.


Por Luís Fernando Franco Martins Ferreira, bacharel e licenciado em história pela Universidade de São Paulo.


(Dedico este texto ao professor Lincoln Ferreira Secco, exímio curador da tradição marxista no Brasil)

2 comentários:

  1. Na última edição da Mouro escrevi uma resenha do livro “Pós-capitalismo, de Paul Mason. Ele defende que as formas básicas de uma economia pós-capitalista podem ser encontradas já no interior do atual sistema. Hipótese com a qual tendo a não concordar. Mas uma das bases dessa hipótese é a teoria dos ciclos de Kondratieff.

    Na teoria de Kondratieff, explica ele, cada ciclo longo tem uma ascensão que dura cerca de 25 anos, alimentada pela implantação de novas tecnologias e alto investimento de capital. Haveria, em seguida, uma desaceleração pelo mesmo período aproximadamente, geralmente terminando com uma depressão. Na fase ascendente, o capital flui para as indústrias produtivas; na fase decadente, ele fica preso no sistema financeiro.

    Da teoria de Kondratieff, seus adeptos deduziram cinco ciclos longos desde a Primeira Revolução Industrial, por volta de 1770, até o quinto, desencadeado pela Terceira Revolução Industrial até os dias de hoje. Cada ciclo, apresentando momentos de ascensão e crises cujos efeitos levariam ao próximo.

    Mason argumenta que as hipóteses de Kondratieff estão essencialmente certas, mas que a crise atual representa uma ruptura desse padrão. Haveria sinais de que ela representa algo maior do que o fim de mais um ciclo ou onda.

    No final da década de 1990, sobrepondo-se ao final da onda anterior, aparecem os elementos básicos do quinto ciclo longo. Ele é impulsionado pelas tecnologias de rede, comunicações móveis, um mercado verdadeiramente global e bens de informação. Mas este último, diferente dos outros, teria estagnado. E a razão pela qual ele estagnou tem algo a ver com o neoliberalismo e algo a ver com a própria tecnologia, afirma Mason.

    Em primeiro lugar, ciclos longos não são produzidos apenas por tecnologia mais economia. Há um terceiro fator crítico. É a luta de classes. E é nesse aspecto que a teoria original da crise de Marx fornece uma compreensão melhor do que a teoria de Kondratieff, diz Mason.

    Se a classe trabalhadora resiste ao ataque, o sistema é forçado a uma mutação mais fundamental, permitindo que um novo paradigma surja. Mas na quarta onda, vigente entre o Pós-Guerra e o início dos anos 1970, fica claro o que acontece quando os trabalhadores não conseguem resistir com sucesso.

    O problema, argumenta o autor, é que, a partir do final dos anos 1980, abre-se um período da derrota e a rendição moral do trabalho organizado. A ausência da resistência dos trabalhadores seria um elemento importante para explicar a longa estagnação pela qual o capitalismo vem passando. Outro elemento seriam as características específicas da economia da informação

    Desculpe o longo comentário, mas foi só pra destacar essa parte da argumentação do autor.

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  2. Muitíssimo grato camarada, excelente comentário, muito bom, vou refletir a propósito decerto, valeu!

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