Quando o dinheiro convola-se historicamente em capital propriamente dito, ele enceta uma revolução social no modo de produção pela transformação da força de trabalho em mercadoria, cabendo destacar que tal mudança qualitativa na história manifestou-se inicialmente na forma da grande revolução industrial inglesa do século XVIII. Mas tal revolução no modo de produção restou
incompleta e inconclusa, pois a força de trabalho afeta à maquinaria e grande
indústria encerra um jaez ainda eminentemente manual ou físico, de tal sorte
que, sem exigir grande nível de qualificação intelectual ou escolar, pode ser engendrada
no âmbito familiar pelo trabalho doméstico.
Ora, se a mercadoria consubstanciada na força
de trabalho, portanto, não é fruto do trabalho assalariado que gera mais-valia,
mas sim do trabalho doméstico no âmbito familiar que não gera mais-valia, então
há uma certa aporia ou contradição no âmago da teoria marxista do valor, pois a
mercadoria consubstanciada na força de trabalho encerraria um caráter especial
que a distingue e opõe às demais mercadorias.
Este caráter especial da mercadoria
consubstanciada na força de trabalho evidencia-se na forma diferenciada da
determinação de seu valor, o qual se estabelece não pelo tempo de trabalho humano
socialmente necessário à sua produção, como acontece com as demais mercadorias,
mas sim pelo valor dos meios de subsistência habitualmente necessários ao
trabalhador médio, o que configura até mesmo, de certa forma, uma tautologia.
Tal aparente aporia, no entanto, foi histórica
e concretamente resolvida pela hodierna revolução industrial digital, que introduziu
e entronizou o software como sua mercadoria por excelência, o qual exige, para
sua produção, uma força de trabalho eminentemente intelectual que somente pode
ser engendrada no ambiente escolar que, por seu turno, exorbita o âmbito
meramente familiar.
Nesse caso, a força de trabalho intelectual
produtora de software é com efeito engendrada pelo trabalho assalariado dos
professores, os quais, por definição como assalariados, também geram
mais-valia.
Destarte, a aporia teórica acima descrita foi resolvida e superada de maneira prática na história, de sorte que a força de trabalho como mercadoria deixa de ser especial e seu valor passa a ser determinado pelo tempo de trabalho humano socialmente necessário à sua produção, notadamente o trabalho escolar dos professores como trabalhadores assalariados.
por LUÍS FERNANDO FRANCO MARTINS FERREIRA, historiador.
Nenhum comentário:
Postar um comentário