Dilma e golpe
Por: Guilherme Boulos
Publicado em :http://www1.folha.uol.com.br/colunas/guilhermeboulos/2015/07/1653510-dilma-e-o-golpe.shtml
A
convenção do PSDB no último domingo selou a guinada lacerdista do partido de
Franco Montoro e Mario Covas. Com discursos recheados de meias palavras, os
tucanos deixaram claro o que ainda não podem dizer abertamente: o apoio à
interrupção do mandato de Dilma e sua prontidão para ocupar o posto.
Coube a
Aécio Neves, em entrevista a uma rádio gaúcha, expressar a meia palavra num ato
falho. "A convenção me reelegeu presidente da República", disse o
presidente reeleito do PSDB. Os atos falhos, mostrou Freud, são sempre
reveladores. Neste caso, revelou aquilo que o também psicanalista Christian
Dunker chamou de uma "falta de luto" de Aécio em relação à derrota
eleitoral de 2014. E uma sobra de despudor.
O
despudor, aliás, é o que melhor define o tom das articulações entre líderes do
PSDB e do PMDB sobre as "saídas políticas". Cassação via TSE?
Impeachment a partir do TCU? Parlamentarismo com Cunha? Temer ou novas
eleições? Tudo isso abertamente nos jornais e, ao que parece, em conexão com
ministros de tribunais superiores, numa perigosa escalada de judicialização da
política.
Numa
palavra, o nome destas articulações é golpismo. Primeiro se constroem as
saídas, depois buscam-se os argumentos que podem legitimá-las. Nenhum golpe se
deu sem argumentos e muitos deles pretenderam-se constitucionais. Não deixaram
de ser golpes por isso.
O tom da
convenção tucana forçou Dilma a reagir numa entrevista dizendo que não irá
cair. Para logo na sequência anunciar que serão tomadas novas medidas de
ampliação do ajuste fiscal. Melhor teria sido o silêncio.
As
reações de Dilma ao fogo cerrado contra seu governo parecem um caso grave da
síndrome de Estocolmo. Quanto mais a direita a ataca, mais a presidenta a
afaga. Repete o mesmo erro de outubro. Ao ser eleita, Dilma deu todos os sinais
à direita acreditando que, com isso, garantiria governabilidade. Deu no que
deu. Agora, mais enfraquecida, repete o mesmo gesto, esperando resultados
diferentes.
É claro
que há um cálculo. Dilma e sua equipe sabem que nenhum golpe prospera sem apoio
da elite econômica. Em particular do mercado financeiro. E este não tem razão
alguma para queixas do governo Dilma até aqui. Aprofundar o ajuste antipopular
poderia ser uma forma de garantir a governabilidade com a banca.
Mas este
cálculo parece subestimar os efeitos da perda de governabilidade nas ruas. O
governo tem hoje 9% de aprovação. O ajuste fiscal é um dos grandes responsáveis
por isso e tudo indica que as consequências mais duras ainda estão por vir. Um
governo tão impopular é um governo fraco.
E a banca
não costuma se destacar pela lealdade. Se o governo não tiver força para
aprovar as políticas de seu interesse –ainda que demonstre disposição para
isso– será atirado aos cães sem qualquer remorso. A cada recuo, Dilma vai
tornando-se em refém desta possibilidade, que seria a mais indigna: ser
derrubada não por contrariar os grandes interesses econômicos, mas por não ter
condições de defendê-los.
O cenário
é complexo. Aos movimentos sociais, cabe ter a firmeza de fazer o enfrentamento
em duas trincheiras. De um lado, combater o golpismo sem tréguas, sabendo que
–se prosperar– dará expressão a uma ofensiva reacionária de longo alcance. De
outro, combater as políticas antipopulares deste governo, que se mostra incapaz
de construir uma agenda que seja defensável.
Movimentos
golpistas marcaram um ato para 16 de agosto. Importantes movimentos populares,
sindicais e estudantis já começaram a se articular para construir uma grande
mobilização em 20 de agosto.
Neste cenário de polarização e incerteza, o que é seguro é que a
política transbordará cada vez mais para as ruas.
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